28 de setembro de 2012

Como negociar coligações políticas


Coligação, tem sido por estes dias "anáfora noticiosa", devido a uma aparente tensão entre os dois partidos  no governo de Portugal, entretanto apaziguada com a criação de um Conselho Coordenador da Coligação. Este Conselho não é inédito,  uma vez que em 1979, os dois partidos através da coligação AD, criaram também um Conselho Coordenador presidido então por Francisco Lucas Pires.
Partilho aqui um interessante resumo, com tradução livre, da intervenção de Josep Maria Reniu, professor titular e director do curso de Ciência Política e Administração Pública, na Universidade de Barcelona, e director do OGC "Observatorio de los gobiernos de coalición", aquando da sua intervenção nas conversas/debates organizados pela Beers & Politics.


A base sobre a qual deveremos começar é a constatação de que toda a actividade política gira em torno da negociação e, portanto, na construção de acordos políticos de todos os tipos e a todos os níveis. Neste sentido, a construção de coligações políticas é, portanto, uma área essencial à definição da actividade política. Neste contexto, e ainda que em modo expositivo, torna-se obrigatório responder a algumas perguntas: porquê negociar/formar coligações? Em que âmbito? Como devem negociar-se? Que pretendemos obter?...


Em relação à primeira pergunta colocada, independentemente do tipo de sistema político em que nos encontramos, o facto é que a construção de coligações responde essencialmente à necessidade de reforçar a base legítima para as instâncias decisoras.  Ou seja, a partir da assunção das próprias fraquezas e necessidades, a criação de uma coligação supõe ampliar a base social sobre a qual será sustentada.

As coligações políticas são essencialmente construídas em três âmbitos, que correspondem a três etapas distintas do processo político: eleitoral, parlamentar e de governo. Em cada uma destas etapas as razões, motivações e expectativas são diferentes. 

No primeiro caso trata-se de, em função do sistema eleitoral, rentabilizar ao máximo a respectiva força de cada um dos partidos da coligação. Em alguns casos, o sistema eleitoral incentiva, quase inevitavelmente, a formação dessas coligações eleitorais que, posteriormente podem também dar lugar a coligações parlamentares e/ou de governo. 

O caso de coligações parlamentares é talvez o que reflecte de melhor forma essa necessidade intrínseca da negociação política. Mesmo em ambientes de maioria, tipicamente com tendência para o bipartidarismo, surge a necessidade de ganhar maior apoio e de contar com uma ampla  base sócio-política para a adopção de certas decisões e/ou definição de determinadas políticas públicas.

Finalmente, a criação de um governo de coligação responde à etapa mais complexa da negociação  de uma coligação política, uma vez que representa a co-responsabilidade da acção governativa, superando as carências próprias de cada um dos parceiros dando lugar a um projecto conjunto em que a negociação possuí maior relevância na formalização de um acordo ou pacto de coligação.



É aqui que é coloca a questão: como se deve negociar?
Cada coligação será diferente e alguns aspectos têm mais influência do que outros, mas podemos encontrar diferentes critérios que nos delimitam o leque de opções de negociação, entre os quais:

1. Experiência prévia (já foi anteriormente feita uma coligação? como terminou?)

2. Expectativas políticas e eleitorais (o que espera cada partido? ganhará mais votos se coligado?)

3. Objectivos prosseguidos por cada um dos parceiros: cargos, políticas públicas, votos ou a coesão interna dentro do próprio partido. Ao negociar deve levar-se em conta a distribuição dos cargos, com base na qualidade e não na quantidade. Evitar uma inflação de membros do mesmo partido em apenas um gabinete do governo, bem como levar a ideologia partidária a cada gabinete adquirido.

4. Relações nos vários níveis político-territoriais, por exemplo, na  Catalunha, PSC ERC ICV já governavam conjuntamente em vários municípios antes de 2003 (eleições para o parlamento da Catalunha).

5. Intangibilidade nas relações pessoais entre os líderes dos partidos. Importantíssimo, tanto que pode criar ou não uma coligação. A previsível dupla Felipe González - Julio Anguita acabou por dar a maioria ao PP, já que eles nem se podiam ver.

A experiência mostra que, no processo de negociação surgem alguns aspectos (ou recomendações) aos quais se devem atender, e que essencialmente se concretiza na máxima: devem negociar-se não só os acordos mas também (e em especial) os desacordos. Só assim poderemos alcançar os objectivos definidos e minimizar ao máximo as crises políticas no interior do executivo.

Para que isso aconteça, devem ser definidos diferentes acordos e protocolos de funcionamento:
- Acordo por escrito, público. E outro interno para servir de guião em caso de crises.
- Prioridades do governo.
- Protocolo de gestão de conflitos, por exemplo criando uma gestão interpartidária. 
- Plano de comunicação de acção conjunta do governo.
- Formação de órgãos comuns para seguimento do cumprimento dos acordos.



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